quinta-feira, 25 de agosto de 2011

CONTORNO ( poema de Torres Matrice ) Torres Matrice







A leveza da luz insinua-se pela casa em traços insuspeitos. Sua geometria estampa sobre os móveis, em paredes, assoalho e no ar, uma inconfessável verdade: a ausência decora, num mosaico de lembranças, secretas miradas na arquitetura do lar. Sombras e luzes disputam a manhã vazia de um adeus sem fim. Tudo aqui é contorno de dor delimitando o dia em que a falta incauta criou lastro de estranheza e solidão no mobiliário silente. Veja, repare, preste atenção: a decoração sabe de cor o olor, o cheiro, a temperatura do corpo de quem já não mais está. Tudo se ressente e sente a falta. Os sons da voz, do riso-guizo, o friso entre a cornija e arquitrave ainda acalenta-os. A casa rumoreja, entre um vão e uma parede, o espectro da alegria que estivera outrora em meio a almofadas e sofás. A sombra, a força, o aroma, a luz: hoje ainda é ontem na ilusão da casa. O frescor da água, o banho, o perfume e o sabonete, a sensação da pele, o toque da mais pura sensação. Houve um tempo em que a vida aspergia beleza, certeza e nobreza e a casa vivia repleta de um úmido futuro sem fim. Para onde vai toda a verdade depois que a casa desaba? E a leveza da luz insinua-se pela casa em traços de um vago pensamento, como um silêncio, às avessas, que não quer ter fim.

Um comentário:

Luiza França disse...

Matrice

Não tenho palavras para descrever o que senti lendo tuas linhas. Uma sensação estranha de já ter estado lá, nesta casa onde tudo é silêncio, saudade, ausência. De fato, esse momnento dói e dói mais ainda não saber quando vai parar, quando vai passar, quando vai ser a manhã em que vamos acordar e sentir que o peito não dói mais, que as lágrimas cessaram e a casa voltou a ter cor.

Mas passa. E quando alguém novo chega trazendo novas cores, novos tons, novos sons é tudo tão melhor.

Bjssssssssss
Luiza
www.barracodevidro.blogspot.com

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